Todos os Sonhos do Mundo, um diário – Rascunho 1

A tarefa, desta vez, é complicada. Estou me propondo a narrar o que acontece com as sessões de “Todos os Sonhos do Mundo”, que, finalmente, estreou ontem para uma temporada que vai até 20/12, com exceção do dia 6/12, sempre de quarta a sábado, às 21h, domingos, às 19h.

O teatro ontem estava lotado. Basicamente de amigos. E vários ilustres na plateia. De críticos (vários!) a psicanalistas, três ou quatro. A dúvida do quarto, que é uma mulher, é porque estava com o Contardo Calligaris e tinha cara de psicanalista, rs.

Em“Todos os Sonhos do Mundo” eu tenho alguns momentos com a plateia. Nada muito desafiador. Pergunto sobre a existência de Deus, sobre destino, se existe ou não existe, e se alguém viveu ou conheceu alguma pessoa que tenha encontrado a depressão pelo caminho. Em geral o público se comunica bem com estas questões, mas ontem foi a primeira vez que que algumas destas perguntas não tiveram uma única resposta.

É comum também eu ser procurado por pessoas que eu não conheço, ao final da peça. Não foi diferente ontem. Foram duas mulheres. A primeira, de Curitiba, disse acompanhar o meu trabalho há muitos anos. Veio com o livro da peça e queria uma dedicatória. Conversamos rapidamente. Ela me disse que estava morando há um ano em São Paulo, que veio pra cá por causa do marido que foi transferido pela empresa em que trabalha. O moço veio primeiro, um ano antes dela. Quando ela chegou, descobriu que ele tinha outra família aqui, com um filho de cerca de um ano. E se pune por isso. Disse que perdeu, porque o sonho do ex-marido era ter uma família numerosa e que ela era estéril. Culpa-se por isso e chorou muito.

— Talvez seja o momento de entender definitivamente que eu vim pra esse mundão de Deus para ficar sozinha, confidenciou-me.

Em seguida, uma outra mulher, filha de uma família de refugiados sírios, com o olhar mais triste da noite. Também queria uma dedicatória no livro com o texto da peça. E enquanto eu ia pensando o que escrever, ia ouvindo ela me contar da dificuldade de sua família de entender que estavam vivendo em um país ocidental, com costumes e culturas muito diferentes do país de onde vieram, e que não conseguia se libertar das amarras da família.

O bonito foram as mensagens que vieram pelo WhatsApp. Em uma delas, uma amiga dramaturga, que eu respeito muito, escreveu:

Ivam, querido, tem uma luz forte emanando de você em cena. Faz do espetáculo, que não é espetáculo, o guia de uma poética nascida da dor e da alegria. Parabéns! Saí tocada de vê-lo tão inteiro ali! Um ator em plenitude, é o que achei.

Em outra mensagem, de um crítico que eu respeito muito, li:

Você enfrentou lindamente aquela plateia paulistana de leões com sua verdade. Quem não descer do pedestal pra ver sua peça não entendeu nada. Isso é o mais bonito. Como temos origens parecidas, fomos do barraco ao palácio, temos essa cumplicidade no enxergar o mundo, o outro. Porque o que importa, de verdade, mesmo, é o simples. E isso você diz lindamente na peça. O resto é pura vaidade. E você descortina isso de um modo desconcertante pra quem é vaidoso. Esse é um mérito enorme.

A maior surpresa da noite foram as flores que recebi das Marias mais lindas, a Helena e a Bonomi, que me ofereceram flores de alho. Que elegância! Nunca tinha visto flores mais lindas antes. Depois publico uma foto bem bonita pra vocês conhecerem.

A minha viagem está apenas começando. Até o dia 20/12 (com exceção de 6/12) estarei no Espaço dos Satyros esperando por vocês. Não me deixem só, por favor.

Ator, roteirista e cineasta. Co-fundador da Cia. Os Satyros e diretor executivo da SP Escola de Teatro.
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