Meyerhold iniciou sua carreira na companhia fundada por Stanislavski e Dantchenko, o Teatro de Arte de Moscou, onde trabalhou por quatro anos, desde sua fundação em 1898. Templo do naturalismo e do realismo psicológico, o Teatro de Arte foi a grande escola de Meyerhold, que em 1902 decide percorrer caminhos próprios, fundando com Kochévérov, outro ator do Teatro de Arte, uma nova trupe, a Sociedade do Drama Novo.
Farto do naturalismo, Meyerhold irá dizer:
O teatro naturalista esforça-se por transformar a cena numa exposição de objetos de museu. (…) O encenador e o pintor procuram determinar o mais exatamente possível o ano, o mês, o dia da ação. (…) Assim nasceu no teatro naturalista o processo de cópia de estilos históricos.[1]
Meyerhold irá se inspirar no impressionismo, no cubismo e finalmente no expressionismo alemão para desenvolver uma pesquisa de trabalho muito particular. Propôs uma nova abordagem: um teatro que “intoxicaria o espectador com força dionisíaca do eterno sacrifício” [2], um teatro estilizado como substitituto da fantasia apolínea sugerida pelo naturalismo.
A partir de pesquisas com a commedia dell’arte, as improvisações, a pantomima, o grotesco e o simbolismo cênico, desenvolveu uma disposição frontal das personagens com pesquisas voltadas à dicção do ator e com a substituição da cenografia complexa do naturalismo pela iluminação como síntese.
Criou o teatro de linha reta: o ator, juntamente com o autor, o diretor e o público são criadores absolutos do fenômeno teatral.
O encenador, depois de ter penetrado a arte do autor, leva a ele sua própria arte – fazendo apenas um, o autor e o encenador. Depois de ter absorvido a arte do autor através do encenador, o ator – sustentado pelo autor e pelo encenador – volta-se para o espectador e abre-lhe a alma livremente; reforça, assim, a interação dos dois fundamentos principais do teatro: o comediante e o espectador.[3]
Embora a participação do público fosse apenas emocional, nunca física, sua imaginação deveria ser empregada “criativamente a fim de preencher os detalhes sugeridos pela ação do palco”.[4] <#_ftn4> Dessa forma, liberaria o ator e levaria o espectador a passar, de uma simples contemplação, ao ato criador:
Veremos que não pretende, de forma alguma, criar o horror em cena, mergulhar o espectador na histeria, fazer fugir o público despavorido. Pelo contrário, pretende levar o espectador a contemplar o inevitável, fremente mas calmo; quer fazê-lo chorar e sofrer mas também enternecê-lo, para chegar a um estado de serenidade e de graça. Seu objetivo essencial é apaziguar as nossas dores, fazendo germinar a esperança na nossa alma, que ora se extingue ora se reanima. Uma vez fora do teatro, o homem prosseguirá sua vida com todas as suas paixões, mas estas deixarão de lhe parecer vãs; as alegrias, os desgostos e os deveres que a vida comporta terão um sentido, porque então ser-nos-á permitido sair das trevas ou, pelo menos, suportá-las sem amargura.[5]
Também se aproxima do movimento construtivista que buscava no campo das artes plásticas e da arquitetura uma arte baseada no materialismo.
A antiga técnica teatral utilizava combinações de diversos acessórios, geralmente camuflados por telas pintadas; oferecia, portanto, esse precedente: combinação de elementos de construção standard. Rejeitando a decoração do tablado, o construtivismo punha o acessório a nu: construía um dispositivo com diversos elementos, modificando as dimensões e as formas em função das suas necessidades, quer dizer, em função da concepção do conjunto da encenação. (…) Assim, encontram-se materializados os seguintes princípios:
1º – Construção linear a três dimensões;
2º – Ritmo visual determinado pelos efeitos cuja natureza não era nem pictural nem em relevo;
3º – Inclusão no dispositivo unicamente de partes construtivas ativas, necessárias ao trabalho do ator.[6]
[1] Vzévolod Meyerhold, O teatro teatral, Lisboa, Arcádia, 1980, p. 31.
[2] Idem, p. 111.
[3] Idem, p 44.
[4] Idem, p. 32.
[5] Idem, p. 46.
[6] Idem, p. 166.