Cine Bijou reabre na Praça Roosevelt: o reduto dos cinéfilos volta com foco em cinema autoral e diversidade

Primeiro cinema de arte de São Paulo, criado em 1962, Cine Bijou reabre pelas mãos da companhia de teatro Os Satyros

Espaço histórico, Cine Bijou formou gerações de cinéfilos desde os anos 1960; reabertura está marcada para o aniversário de São Paulo

por Denize Bacoccina

A companhia de teatro Os Satyros, que já tem um teatro na Praça Roosevelt, vai reabrir, na mesma praça, o Cine Bijou, espaço que formou gerações de cinéfilos desde os anos 1960 em São Paulo.

A reabertura está prevista para o dia 25 de janeiro, aniversário de São Paulo, com uma programação especial e gratuita. O cinema foi todo reformado, para se adequar aos novos padrões de segurança e acessibilidade. Mas as cadeiras de couro vermelho da plateia continuam lá, limpas e restauradas.

Inaugurado em 1962, o Cine Bijou foi o primeiro cinema de arte do país e funcionou até 1997. Depois disso, o espaço foi alugado para alguns teatros, até 2018.

SALA PATRÍCIA PILLAR

O novo Cine Bijou será oficialmente inaugurado no dia 25, às 20h, com o filme Zuzu Angel, estrelado pela atriz Patrícia Pillar. A atriz, grande incentivadora do projeto, dá nome à sala.

O Bijou quer retomar essa tradição de exibir filmes de qualidade, inovadores, que provoquem reflexões, trazer o cinema de volta para o espaço que ele já ocupou na cultura paulistana no passado, como local de exibição para filmes de arte por mais de três décadas. “Eu desenvolvi minha paixão pelo cinema nos anos 1980, assistindo Pasolini, Fellini, Bergman, todos no Bijou. Era o centro de cinefilia de São Paulo”, contou Rodolfo Garcia Vázquez, fundador da companhia de teatro Os Satyros junto com Ivam Cabral. “É com muito orgulho que vamos devolver o projeto de um cinema de arte para aquele espaço, dialogando com os novos tempos e a nova Roosevelt”, diz ele.

A programação de estreia ainda terá a exibição de Um Animal Amarelo, de Felipe Bragança, Filosofia da Alcova, de Rodolfo García Vázquez e Ivam Cabral, Zimba, de Joel Pizzini, 30 Anos Blues, de Andradina Azevedo e Dida Andrade, Riocorrente, de Paulo Sacramento, Hipóteses Para o Amor e a Verdade, de Rodolfo García Vázquez, e Ralé, de Helena Ignez, entre outros.

Nas duas primeiras semanas de fevereiro serão exibidos os filmes, curtas e longas, premiados no Festival Satyricine Bijou, que foi realizado online em setembro de 2021.

Todas as sessões serão duplas, com a exibição de um curta-metragem antes da exibição do longa. Nos dois primeiros meses de funcionamento, a entrada será gratuita e somente a partir de março haverá bilheteria, com preço reduzido, como já acontece no teatro da companhia.

CINE BIJOU COMO ESPAÇO DE DIVERSIDADE

“A ideia é que seja um espaço para a diversidade do cinema, com filmes realizados na periferia, por negros, por mulheres, por LGBTQ. E também um espaço para produção independente nacional e algumas mostras com cinema internacional”, diz Rodolfo. “Estamos bem animados.”

O cinema tem 75 lugares e dois espaços para cadeirantes. A sala de projeção está equipada com projetor com DCP e KDM, além de um player multimidia que permite a projeção em outros formatos.

“O Bijou será totalmente voltado para o cinema autoral, privilegiando a diversidade e a arte em toda sua complexidade. Uma sala de cinema gerida por um grupo de artistas coordenado pelos Satyros, que pretende manter a importância que teve na história das décadas de 60, 70 e 80, como um espaço de resistência diante da ditadura militar”, diz o curador e produtor Guilherme Marback.

O novo Bijou, diz ele, quer atingir o público jovem, cinéfilos e apaixonados por cinema, em sintonia com as novas lutas e demandas do século 21. “Estamos abertos a sugestões e propostas ousadas e pretendemos ser um importante núcleo de exibição e reflexão sobre a produção independente de cinema do Brasil e de todo o mundo. Vamos, também, nos ligar a todos os festivais e mostras que acontecem anualmente em São Paulo”, diz Guilherme.

Depois da semana de inauguração, o Cine Bijou terá programação de cinema de quinta a domingo. Quinta-feira é dia de cinema falado, um filme seguido de uma discussão sobre o tema com convidados. Às sextas e sábados haverá ainda sessão à meia-noite e uma delas a ideia é ter um cinema no escuro, um filme surpresa. “O Bijou tinha isso na época da ditadura, mostrando filmes proibidos. Foi assim que eu assisti O Discreto Charme da Burguesia, nos anos 1970, que era proibido na época”, conta Guilherme.

Como além da tela o espaço também tem palco e camarim, pode receber peças de teatro e shows musicais. “Uma coisa importante é que não temos vínculo com nenhum patrocinador, com nenhuma entidade. É um cinema gerido por artistas, na cara e coragem”, diz Guilherme. Para viabilizar a reforma e o aluguel durante todos esse período que permaneceu fechado, o grupo contou com doações de artistas, amigos, vaquinhas virtuais, emendas parlamentares e outros apoios.

TRADIÇÃO CULTURAL DA ROOSEVELT

O espaço histórico, no número 172 da Praça Roosevelt onde até 2018 funcionou o Teatro do Ator, poderia ter tido outro destino quando, em 2019, Ivam e Rodolfo souberam que o espaço desocupado deixaria de ser um teatro. Embora não pretendessem abrir um novo espaço na rua, pois na época já administravam outros dois teatros – um deles fechou durante a pandemia e hoje é uma escola de atuação – Os Satyros decidiram alugar o espaço quando souberam das outras propostas recebidas pelo proprietário.

“Não passava pela nossa cabeça pegar mais um espaço, mas quando soubemos que poderia virar uma igreja ou mais um bar fizemos um esforço hercúleo e decidimos pegar”, contou Ivam Cabral. A ideia era fazer uma rápida reforma e reabrir no início de 2020, mas a pandemia mudou os planos.

Espaço histórico do teatro brasileiro que passou por um momento de decadência, a Praça Roosevelt recuperou – graças ao trabalho iniciado pelos Satyros em 2000 – nos últimos anos sua vocação de espaço de manifestação artística, cultural e boêmia. A Praça tem ainda o teatro dos Satyros, Parlapatões, Teatro Heleny Guaryba, que ainda não reabriu após a pandemia.  e, até o ano passado, o Teatro do Ator, que agora reabrirá como Cine Bijou. No fim de 2017, o cineasta argentino Roberto Fernández tentou reativar o Cine Bijou como um cineclube, no teatro ao lado, mas a ideia durou apenas uma temporada.

Fonte: A Vida no Centro

Ator, roteirista e cineasta. Co-fundador da Cia. Os Satyros e diretor executivo da SP Escola de Teatro.
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