Satyrianas – 78 Horas em 78 Minutos, o filme: Crítica

Satyrianas: a narrativa passeia sempre, então, entre o registro documental e o fictício.

por Aline Senzi

“Vocês querem fazer um documentário com uma atriz? É estranho”, diz o diretor fictício Jeff Luna. É com esse humor e metalinguagem que o trio de diretores Daniel Gaggini, Fausto Noro e Otavio Pacheco realiza Satyrianas – 78 Horas em 78 Minutos, filme que mistura as linhas entre ficção e realidade.

Satyrianas é uma festa de teatro que ocupa por três dias ininterruptos a Praça Roosevelt, no centro de São Paulo. Com 12 edições completas, o evento realizado pelo grupo teatral Os Satyros se tornou um festival de referência da cena cultural paulistana, assim como a revitalizada praça que serve de palco das apresentações e atividades.

A importância do festival para uma cidade como São Paulo e para a cena teatral da capital paulista é discutida por meio de entrevistas com gente conhecida do público do espaço. Sem identificações, mas com muito bom humor, dão suas opiniões os fundadores d’Os Satyros, Rodolfo Gárcia Vázquez e Ivam Cabral, assim como Aimar Labaki, Rubens Ewald Filho, Mário Bortolotto, Evaldo Mocarzel, Hugo Possolo, Laís Bodanzky, Bráulio Montovani, Zé Celso Martinez e Phedra de Córdoba, entre outros.

 Além do evento, no entanto, esses personagens versam sobre a relevância do próprio teatro, não como espelho da realidade, mas como uma quebra e travessia dele. Mais do sugere o subtítulo do filme, Satyrianas – 78 Horas em 78 Minutos é um registro dos bastidores e de tudo o que faz parte de seu universo.

Os bastidores do próprio documentário também são retratados de maneira ficcional. No filme, um investidor contrata um cineasta italiano que estaria em alta devido a sua produção de filmes de ficção nos EUA – uma mistura de David Fincher e Michel Gondry, como descreve Rubens Edwald Filho. Jeff Luna seria o encarregado para fazer um documentário sobre o festival.

O personagem serve, diretamente ou não, de crítica a muitos elementos da produção audiovisual, como a valorização das obras estrangeiras, e gancho para outros debates, como a nudez artística ou não. Serve também, de certa maneira, como um comentário à dimensão cult/pop que a Satyrianas adquiriu nos últimos anos. Essa crítica se faz presente também em entrevista do ator, diretor e dramaturgo Mário Bortolotto. “As celebridades começaram a baixar lá porque era bacana. Na verdade, eles estão cagando para teatro”, afirma.

A narrativa passeia sempre, então, entre o registro documental e o fictício. Uma das melhores cenas é o momento em que essas linhas mais se embaralham, no depoimento de Ivam Cabral sobre como a Satyrianas surgiu de um trote que fizeram com a cantora Vanusa.

A balança pesa um pouco na segunda metade, quando a história da equipe de filmagem começa a se prender demais a clichês de uma produção conduzida por um diretor prepotente. No entanto, essa escolha dos diretores faz de Satyrianas – 78 Horas em 78 Minutos não apenas um retrato do evento, mas da própria natureza do teatro e do ator, aproximando-se, nesse sentido, de Jogo de Cena, de Eduardo Coutinho. O que se vê num palco é real, assim como o que se vê na tela, seja fictício ou não.

Satyrianas – 78 Horas Em 78 Minutos
Direção: Daniel Gaggini, Fausto Noro, Otavio Pacheco. Brasil, 2012. 78 minutos. Estreia no Brasil: Festival do Rio 2012. Lançamento em circuito comercial de cinemas: 13/9/2013. Classificação indicativa: 14 anos. Veja o trailer.

Fonte: R7, 13 de setembro de 2013

Ator, roteirista e cineasta. Co-fundador da Cia. Os Satyros e diretor executivo da SP Escola de Teatro.
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