REFLEXÃO | Parlapatões, o amálgama de inteligência e paixão

A importância dos Parlapatões, Patifes & Paspalhões para o teatro de São Paulo é difícil de mensurar. Os Parlapas, como são também carinhosamente chamados, foram o segundo grupo a aterrissar na Praça Roosevelt, em 2006, e sua presença se mostrou decisiva para o ambicioso projeto de renovação urbanística e cultural do centro da cidade a que Os Satyros deram início no ano 2000. Graças a esse trabalho em rede, a região transformou-se de um território degradado em polo artístico e econômico. Outras companhias chegaram, novos teatros e bares abriram as portas e o público da cidade inteira veio prestigiar. O antigo espaço de criminalidade e desesperança virou um dos mais prestigiados símbolos da metrópole.

No livro Teatro de grupo na cidade de São Paulo e na grande São Paulo: criações coletivas, sentidos e manifestações em processo de lutas e de travessias, obra que publicamos recentemente por nosso selo Lucias, são diversos os coletivos da cidade que apontaram os Parlapatões como parceria decisiva em suas trajetórias, entre eles, apenas para mencionar alguns, a Companhia Pia Fraus, Cia. Contraste, Cia. London, Grupo Esparrama, Teatro Cartum e Trupe Ânima. Seja como referência estética para os grupos mais novos ou como solidário teatro para ensaio e apresentações desses coletivos, os Parlapatões e sua sede na Roosevelt representam perfeitamente um amálgama de sucesso: promovem teatro de qualidade; funcionam como polo cultural e espaço de urbanidade, e, por que não, boemia; gerenciam um estabelecimento comercial bem-sucedido que proporciona vários empregos diretos e indiretos.

Por essas e outras é que Hugo Possolo e Raul Barretto são respeitados e admirados em todo o Brasil. Palhaços natos e muito brincalhões em seus cotidianos profissionais e de sociabilidade, não fazem nenhuma questão de ficar exibindo seus extensos currículos. Afinal, como é que o público que os assiste brilhando e fazendo pirraça nos palcos poderia imaginar que o primeiro cursou comunicação social na Cásper Líbero e história na USP, ao passo que o segundo se formava em engenharia civil na Faap? Mas foi o circo e o teatro que fizeram a cabeça dos dois e forjaram seus corpos elásticos e mentes inquietas, levando-os a percorrer uma trajetória de muito estudo e trabalho.

Hoje Hugo Possolo é dramaturgo, ator, cenógrafo, figurinista e diretor de teatro, circo e ópera. Escreveu mais de 30 peças e dirigiu mais de 50 espetáculos em sua carreira. Foi diretor artístico do Theatro Municipal e secretário municipal de Cultura de São Paulo. O palhaço, malabarista e atirador de facas Raul Barretto, por sua vez, realizou, como palhaço e produtor, mais de 40 espetáculos, participando dos principais festivais nacionais e internacionais. Juntos, ajudaram a fundar a SP Escola de Teatro – Centro de Formação das Artes do Palco, instituição respeitada no mundo todo, cujo sistema pedagógico é investigado atualmente em várias universidades europeias.

E essa provavelmente seja a maior vocação de ambos e dos Parlapatões: a pesquisa. A cada montagem levantada, em cada aula que ministram na Escola, a cada livro novo que publicam, tecem novas conjunturas estéticas, desconstroem os paradigmas superficiais que interpretam o humor e a comédia como representantes do baixo escalão do panteão cênico, e agregam todas que estão ao seu redor. Como imãs, atraem para o entorno de si o que há de melhor nas pessoas, pois verdadeiros astros sempre terão cidadãos honestos, gentis e trabalhadores gravitando ao seu lado.

Ator, roteirista e cineasta. Co-fundador da Cia. Os Satyros e diretor executivo da SP Escola de Teatro.
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