Durante mais de um ano, o caso do assassinato da menina Nardoni ocupou todas, absolutamente todas as manchetes da imprensa escrita, televisiva e digital deste país. As emissoras de televisão viram suas audiências aumentarem vertiginosamente em um delirio nacional de paixões. Os jornais viram sua circulação aumentar absurdamente.. E as empresas de comunicação obtiveram excelentes resultados lidando com esta tragédia. Nunca antes na história deste país…
Programas de tv esmiuçaram a história trágica da morte da menina indefesa. Cada imagem de tv, cada passo dos envolvidos, cada hipótese, tudo foi exaurido de forma quase mórbida. Especialistas foram convocados a falar sobre o assunto, de milhares de pontos de vista. Os envolvidos cederam entrevistas únicas a programas tradicionais que alardearam sua grande exclusividade. Todos puderam falar sobre o assunto: de celebridades a mães anônimas, de pedreiros a psicólogos, de autoridades a jogadores de futebol. Na ocasião, ninguém se calou em respeito à dor da família. Ao contrário, todos puderam se exprimir abertamente para milhões de pessoas em rede nacional. Todos puderam dizer como aquele horror os tocava.
Todos. Todos. Todos.
Mas infelizmente, no Brasil de 2013, o teatro não tem o direito de fazer o que todos puderam fazer: refletir sobre a tragédia que abalou nosso imaginário.
Anos após o acontecimento e com o julgamento encerrado, o teatro não tem o direito de investigar como este caso trágico traz elementos importantes para discutir nossa sociedade, a questão da pós-família, das novas estruturas de parentesco, e as questões subjacentes a ela. Nem mesmo em uma pequena sala de teatro perdida no burburinho do centro de São Paulo, isso poderia ocorrer. Ou alguém acredita que a nossa temporada teria mais do que 0,1% da audiência de qualquer grande programa de tv que tenha abordado o assunto na época?
Nem mesmo sabendo que nosso espetáculo, é inspirado na tragédia dos Nardoni, assim como também em uma série imensa de mitos e relatos, textos teatrais e lendas. Nem mesmo assim, podemos expressar-nos.
Devemos nos calar. A arte deve se calar. No Brasil de 2013, cabe-nos apenas o direito de realizar alguns espetáculos.
O teatro deve dialogar com o seu tempo mas não, o teatro não deve tocar no lado mais profundamente assustador de nossa sociedade! – essa é a lei que nos rege.
Ele deve apenas servir um cardápio colorido de espetáculos com o selo do “politicamente correto”.
E o resto da sociedade? Todos os especialistas? As mães? Os jogadores de futebol? As celebridades? Eles podem ir aos programas de TV e continuar a falar o que quiserem sobre os Nardoni, os Matsunaga, etc… E as tvs abrirão seus canais para que eles falem tudo o que quiserem. E poderão acompanhar de perto seus indices de audiência.
Por que só o teatro não pode?
Por que só o teatro incomoda?
#TeatroSemCensura
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