Festival de Curitiba, uma primavera para o teatro

por Ivam Cabral
ivampsic@gmail.com

Quando no final do ano passado o Leandro Knopfholz, diretor do Festival de Curitiba, me procurou nos convidando para a edição dos 30 anos do evento, que se realizaria entre março e abril, eu não botei muita fé.

Naquele momento, em novembro, a gente tinha acabado de estrear “Aurora”, ensaiada no meio da pandemia, primeiro através de meios digitais e, depois, em in loco, no Espaço dos Satyros, com todos os cuidados necessários que os protocolos sanitários pediam.

Inclusive, por conta disso, tanto dramaturgia quanto encenação foram atravessadas por esse momento difícil. O texto caminhou mais para o narrativo, sem muitas intervenções dramáticas entre os intérpretes; e, quando acontecia, a direção resolvia com soluções inventivas que sempre trabalhavam com alguma distância segura entre o elenco.

E aconteceu algo curioso – cômico, se não fosse (muito) trágico: em dezembro, apenas com três semanas em cartaz, a peça teve que ser retirada de temporada porque, dos sete atores do elenco, cinco contraíram o vírus H3N2, variante do vírus Influenza A. Eu, inclusive. Passei quase 24 horas no pronto atendimento de um hospital, tamanha gravidade do quadro.

Então, quando o Leandro nos provoca com a possibilidade de estarmos em Curitiba, no festival, a gente aceitou, mas muito mais como um ato de cordialidade. Na real, duvidei que o evento acontecesse até chegar em Curitiba, no último dia 4 de abril, onde aportamos para apresentações de dois trabalhos, “Pessoas Brutas” e “Aurora”, além do lançamento de meu novo livro, “Entre o nada e o infinito” (Giostri Editora).

Chegamos no meio do fervo, o festival tinha começado na terça (29/3) e o que encontramos na cidade foi, primeiro, um grande susto.

O baque inicial aconteceu logo na chegada ao hotel onde os artistas e equipes do festival estavam hospedados. Além dos funcionários do hotel, ninguém ali usava máscara. Inclusive nos minúsculos elevadores. Comecei a ficar apavorado!

Já nessa noite, uma segunda-feira, resolvi ir ao teatro para assistir “Sem Palavras”, da Companhia Brasileira, mas desisti na fila de entrada. O teatro estava lotadíssimo, umas 600 pessoas, e mais de 50% deles não utilizavam máscaras. Não me senti nada seguro.

Bom, o que se sucedeu depois disso foi uma loucura. Em todos os lugares por onde transitei, inclusive nas plateias de nossas apresentações, muita, mas muita gente mesmo. Todas ávidas por teatro, vendo tudo, aproveitando cada segundo. Então eu comecei a chorar. Passado o susto inicial, cada vez que eu via uma aglomeração, eu me emocionava. Afinal, ali, o teatro estava vivo e cheio de energia.

O impossível aconteceu e presenciamos todos, artistas e espectadores, um milagre. Um grande milagre. A primavera do teatro brasileiro floresceu em Curitiba, em pleno outono.

E esta edição do Festival, a trigésima, já nasceu histórica. Com algum controle da pandemia, celebramos a volta do público e a emoção tomou conta das muitas dezenas de apresentações, nestes 12 dias de festa. Foi impossível não se emocionar quando pressentíamos o burburinho do público chegando para assistir aos nossos espetáculos.

E na manhã do dia 8/4, sexta-feira, vimos nascer meu livro “Entre o nada e o infinito”. E, mais uma vez, um milagre. O evento, às 11h da manhã, tinha um público incrível e surpreendente, que lotou o lindo e imponente Espaço Alfaiataria, na rua Riachuelo, bem no coração da cidade.

Não, não me iludo. A pandemia não terminou e teremos todes que lutar com todas as nossas forças para que este momento tão difícil seja superado. Até porque queremos e precisaremos da saúde dos nossos públicos. Sim, com respeito aos protocolos e com todas as doses da vacina em dia. E viva a ciência e os profissionais da saúde, heróis deste tempo tão conturbado.

E que as deusas de todas as artes nos abençoem e que possamos continuar a celebrar. Viva o teatro, vivo e saudável, sim! Porque, já disse certa vez e preciso que acreditem em mim: o teatro é tão vital quanto o ar. Mas, como o ar, parece nada.

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