NA MÍDIA: Cia. Satyros Trata do Impacto das Novas Tecnologias em ‘Cabaret Stravaganza’

Foto: Flavio Morbach Portella

No novo espetáculo teatral, efeito que mudanças da Era Digital fizeram em nossos corpos é tema

Uma nova humanidade demanda, necessariamente, um novo teatro. Foi guiada por essa crença que a cia. Os Satyros criou Cabaret Stravaganza, espetáculo que entra hoje em cartaz.

Em pauta, está o impacto das novas tecnologias sobre o homem. O efeito que tantas mudanças tiveram sobre nossos corpos, nossas formas de relacionamento, nossa maneira de ver e compreender o mundo. “Estamos diante de uma outra humanidade. Quem seria Hamlet hoje? Será que ele teria um perfil no Facebook? Uma identidade falsa?”, questiona o diretor Rodolfo García Vázquez. “Não vamos conseguir tratar disso se usarmos as formas dramáticas convencionais.”

Em uma de suas montagens anteriores, Hipóteses sobre o Amor e a Verdade, o grupo já ensaiava os primeiros passos em direção ao que chama de “teatro expandido”. Na peça de 2010 eles já experimentavam mirar o território dos “amores líquidos”. Flagravam relacionamentos nascidos em ambiente virtual e, para retratá-los, optavam por uma forma fragmentária.

Em Cabaret também não existe uma fábula a conduzir a encenação. À maneira de um cabaré dadaísta, elencam-se quadros, aparentemente desconectados. Sucedem-se assim histórias de suicídio, de depressão, do impacto do uso de medicamentos, da dependência que criamos em relação a aparelhos eletrônicos.

Outro dado que aparecia em Hipóteses e que será retomado no trabalho atual é o pendor para a performance. Não vemos propriamente personagens, mas atores que se colocam em cena e vasculham suas biografias.

Nesse sentindo, estão lançadas as bases de uma estética que flerta com a dinâmica própria do reality show. Capaz de exacerbar ainda mais o cunho performático que já ronda o teatro há pelo menos três décadas. “Não estamos buscando referências dentro do teatro, mas fora dele. Em pessoas que estejam discutindo essa nova realidade”, lembra o diretor.

Alçada a primeiro plano está a noção de ciborgue. E, aqui, não se está a falar de alguma distante criatura, que povoa apenas as narrativas de ficção científica.

Revela-se o corpo modificado pelos implantes mecânicos, mas também pelas evoluções nas áreas de nanotecnologia e genética. Pelas possibilidades de cura e de transformação ofertadas pela medicina.

Quando entram no palco, os atores não deixam de lado seus apêndices eletrônicos: laptops, iPads e iPhones são utilizados para criar imagens, iluminar cenas, mostrar gravações. “Toda a nossa relação com o mundo hoje é eletrônica. E esse mundo digital não é apenas uma fantasia. Ele afeta diretamente o mundo real, físico”, comenta Vázquez.

O que se delineia é, inegavelmente, um teatro de feições políticas. Preocupado em tematizar o fim das utopias, em falar da dissolução dos rituais, de vida e de morte. “Vivemos um momento de tradições esvaziadas. Não temos comunidade, vínculos”, diz o diretor.

Sem tomar partido – não se trata de louvar as mudanças tecnológicas nem tampouco de assumir um olhar nostálgico para uma era pré-eletrônica -, a intenção é trazer essas novas questões para dentro da peça. “Se o teatro não dialogar com isso, ele não tem nenhum futuro.”

O que acontece virtualmente deve impactar Cabaret Stravaganza ao longo da temporada. Já é possível acompanhar pela internet o projeto Lou – Leo, uma das facetas do espetáculo. Para fazer uma masectomia, o ator transexual Léo Moreira de Sá lançou uma campanha para arrecadar R$ 15 mil. “O corpo hoje é capaz de transformar-se. As noções de gênero, como as conhecíamos, não existem mais”, pontua o diretor Rodolfo García Vázquez. Ao se submeter à cirurgia, Léo pretende adaptar seu corpo feminino a uma nova forma. A intenção é relatar as etapas desse processo durante o espetáculo. “Mostramos como o mundo digital tem uma interface com o mundo real”, diz Vázquez.

Fonte: Maria Eugênia de Menezes, Estadão, 20 de outubro de 2011.

 

Ator, roteirista e cineasta. Co-fundador da Cia. Os Satyros e diretor executivo da SP Escola de Teatro.
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