Há exatos 14 anos, eu estava em Paris. Andrea Matarazzo era o secretário de Cultura e, ao receber um convite para viajar à França, pediu que eu fosse em seu lugar. Foi através de um telefonema de Paris para a SP Escola de Teatro que soube de uma cachorra que havia aparecido na escola para dar à luz seis filhotes num espaço cheio de entulho, no terreno da instituição. Lembro-me claramente de que não vi com bons olhos aquela história — até então, não tinha nenhuma relação com cachorros.
Quando retornei ao Brasil e conheci aquela jovem senhora com seus filhotes, fiquei apreensivo. Não foi paixão à primeira vista. Mas eu não podia fazer mais nada, a escola inteira já estava apaixonada pela cachorra e seus rebentos.
Decidiu-se, meio contra minha vontade, que cuidaríamos da Cacilda — sim, nesse momento ela já havia ganhado esse nome, escolhido por votação entre funcionários e estudantes da escola.
Fiz uma exigência, no entanto: que arrumássemos adotantes para os filhotes. E assim foi. Por mais de dois anos, Cacilda viveu na escola, sendo cuidada e paparicada por todos. Mas quem é de todos acaba não sendo de ninguém. No meio do caminho sempre apareciam fins de semana, feriados e férias, e ela ficava sozinha.
Nesse período, eu havia perdido minha mãe e vivia um momento dificílimo com minha depressão. Me afastei do teatro e descobri Parelheiros. Foi uma época de muita solidão. Tempo em que Cacilda se tornou uma das figuras mais importantes da minha vida.
No último dia de 2012, Chico apareceu em nosso mundo. A partir desse dia, nunca mais ficaria sozinho. Roubei a Cacilda da escola e passamos a dormir com o Chico no mesmo quarto, a fazer nossas refeições juntos, a passear juntos. E nunca mais encontrei limites entre o amor e a vida. Descobri o amor incondicional.
Mas o tempo voa e um dia Cacilda desviveu. Em 2022, quando ela se foi, perdi um pouco o rumo. Uma parte importante da minha vida se encerrou com sua partida. Afinal, aquela mocinha havia se transformado em um dos maiores amores da minha vida!
