Não, não tenho nenhum prazer extraordinário de, desde o ano passado – precisamente desde 20 de março de 2020 –, ligar uma câmera no meu notebook e iniciar uma transmissão de teatro pela internet.
Ninguém mais do que nós, artistas de teatro – e encho a minha boca para esta afirmação porque, após insistentes convites para ir à televisão nestes mais de 30 anos de vida no teatro, continuo sendo um bicho exclusivo do teatro – sente saudade do cheiro do teatro, da aglomeração do teatro, do povo do teatro, das confusões do teatro.
Então, por favor, sejamos apenas realistas. Esta cambulhada em que nos metemos não terminará nos próximos meses. Falo em nome da ciência e, por favor, não sejamos negacionistas.
O teatro precisa continuar a existir. Se a única maneira que encontramos foi o modo digital, então por favor, nos respeitem.
Nestas sessões digitais, por trás de cada uma dessas máquinas que se conectam, existe um artista desesperado buscando sua sobrevivência. Não nos desautorizem, por favor. A direita e os reacionários estão loucos para que sucumbamos. Não podemos morrer. É um apelo, um grito.
Ninguém mais do que nós, povo do teatro, está em prantos. E estamos aos prantos há meses. Há geladeiras que precisam ser abastecidas, corpos que necessitam de alimento, vidas que precisam continuar a sonhar.
Enquanto isso, choro por aqui. Com saudade da minha vida na praça Roosevelt, desaparecida há quase um ano. E sentindo falta de tudo o que vocês sentem, também. Mas com esperança na humanidade, ainda que muitas vezes reconheça a minha ingenuidade.
E, por último, o apelo derradeiro: críticos, curadores, jornalistas, premiações de teatro, povo do teatro, público, por favor, não soltem as nossas mãos. Este é um grito de socorro!
+++ na foto, Fábio Penna em “Cabaret Fucô”, 2016
