Até domingo, evento vai promover leituras de textos inéditos; nesta edição, festival não será ininterrupto
GUSTAVO FIORATTI
DE SÃO PAULO
A maratona cultural Satyrianas, que o grupo de teatro Os Satyros promove na praça Roosevelt, no centro de São Paulo, comemora uma conquista na edição que começa hoje e prossegue até domingo: a praça agora está reformada.
Desde o primeiro festival, realizado no fim de 2002, a companhia chamava a atenção para o estado de abandono daquele endereço.
“Enfim, agora vamos fazer um evento sem cheiro de xixi e sem goteiras”, diz Ivam Cabral, um dos fundadores do grupo (leia ao lado), referindo-se às edificações que foram demolidas.
A reinauguração da Roosevelt em setembro passado já permitiu ocupações culturais diversas, como a manifestação política “Existe Amor em SP”, que no último dia 21 apresentou shows como o do rapper Criolo.
O formato desta edição das Satyrianas é semelhante ao dos festivais anteriores. Espalha-se pela praça em eventos ao ar livre e em três tendas principais, uma delas dedicada ao hip- hop, uma das novidade deste ano.
O evento também se instala pelos teatros dos arredores. Na São Paulo Escola de Teatro, por exemplo, será realizado um dos carros-chefes do evento, a série de leitura de peças teatrais DramaMix, em que autores apresentam textos curtos e inéditos.
A diferença é que, agora, as leituras não ocorrem continuamente ao longo de 78 horas. Sua programação se concentra entre 18h e 2h.
E, desta vez, o evento também não é ininterrupto: haverá pausas pelas manhãs, principalmente entre 5h e 12h. “Queremos respeitar os moradores”, diz Cabral.
Haverá ainda apresentações de pequenos espetáculos em lugares inusitados. Alguns serão realizados dentro de automóveis. Há peças em que o espectador fica do lado de fora de um carro parado, há outras em que a microplateia entra no veículo, que se movimenta pelas ruas.
A indicação de como chegar ao local onde os carros estarão estacionados será dada na bilheteria do festival, que fica na própria praça.
A programação será encerrada no domingo, às 22h, na São Paulo Escola de Teatro, com a exibição do documentário “Satyrianas, 78 Horas em 78 Minutos”.
O filme tem direção de Daniel Gaggini, Fausto Noro e Otávio Pacheco e retrata edições passadas do Satyrianas.
‘FOI A DEGRADAÇÃO DA PRAÇA ROOSEVELT QUE ME INSTIGOU’
IVAM CABRAL
ESPECIAL PARA A FOLHA
Minha relação com a praça Roosevelt é intensa. O local foi um dos meus redutos de diversão e ocupou o meu imaginário.
Quando, no final dos anos 1980, saí de Curitiba para viver aqui, pelo menos três lugares ali me eram inspiradores: o Cine Bijou, a boate Cais e o Corsário, um bar gay decadente.
Em meados do ano 2000, decidimos aportar com o grupo Os Satyros na praça, e sua degradação primeiro nos assustou; depois, nos instigou.
Entre sustos e sobressaltos, insistimos em fincar pé no terreno.
Porque sempre soubemos: a nós, artistas, cabe a parte mais chata da brincadeira, limpar a sujeira da sociedade e depois ser varrido junto com ela.
Quando me pedem para falar da nova praça, me ocorre lembrar que os processos de urbanização obedecem ao mesmo padrão.
E isso não tem a ver com gestões políticas. É o deus mercado comandando com seu pulso impiedoso. A nós, a resistência. Só ela.
IVAM CABRAL é um dos fundadores do o grupo de teatro Os Satyros
Fonte: Folha de S. Paulo, 1 de novembro de 2012