por Nelson de Sá
No último fim de semana, fui à praça Roosevelt ver “Recusa”, mas o que queria mesmo era ver a própria praça. Queria ver a praça enfim reinaugurada _a tempo de pegar a eleição, ainda que com a reforma incompleta_ e também a escola montada pelos governos estadual e municipal para a Organização Social dirigida por Ivam Cabral.
A peça é muito bem realizada, por Maria Thaís. É uma encenação rigorosa, visualmente de impacto, com intérpretes precisos. Thaís reafirma sua qualidade como encenadora, e além disso revela dois atores de especial grandeza.
Tanto física como vocalmente, Eduardo Okamoto e Antonio Salvador apresentam um espetáculo que faz jus ao tema e aos seres humanos que buscam espelhar _e dois índios em particular.
A peça parte de uma reportagem que João Carlos Assunção e Claudio Angelo publicaram no jornal há quatro anos, aqui, intitulada “Funai recorre à procuradoria para proteger área de dois índios isolados”, mais precisamente, os dois últimos membros de uma etnia de Rondônia, os piripkuras.
A partir daí, dessa imagem inicial de dois seres humanos isolados, na selva como no palco, “Recusa” aborda a questão indígena de vários pontos de vista, desde o debate sobre Código Florestal ou hidrelétricas, que é o mais simples, até os mais profundos, como o vínculo do homem com o animal.
Nesse último ponto, a interpretação ecoa o célebre conto de Guimarães Rosa representado tão celebremente quanto por Paulo Autran, “Meu Tio o Iauaretê”. Foi o que vi de mais marcante de Autran: ele se mesclava fisicamente a um animal. Okamoto e Salvador não chegam a tal simbiose, ao menos em seu primeiro fim de semana, mas também deixam marca.
O problema de “Recusa” está no texto. Luís Alberto de Abreu, de grande talento para aproximar dramaturgia e público, como nas peças populares que fez para a Fraternal Cia. de Arte e Malas-Artes por mais de uma década, desta vez adapta mitos diversos e não parece buscar qualquer fio narrativo, o que resulta pouco teatral.
Soa aleatório, deixa a sensação de que poderiam ser muitas cenas ou peças diferentes, um amontoado que poderia começar e terminar em qualquer lugar, por horas sem fim e sem ritmo.
Para além da peça, o espaço no primeiro andar da SP Escola de Teatro, um prédio adaptado, é um avanço em relação àqueles dos Satyros, ao lado e algumas casas adiante.
É menos uma sala de teatro, distante até de um auditório de convenção como há tantos hoje voltados para teatro, e mais uma sala de ensaio, que se abre para uma pequena plateia. É limitado para os espectadores, mas é relativamente amplo para as encenações.
A escola como um todo, a exemplo da praça, ainda parece em construção, ao menos nos primeiros andares. Mesmo assim, promete. E é maravilhoso que, embora criada por um grupo ligado a um político em especial, abrace outros artistas, relacionados a outros políticos.
Thaís e Abreu são muito identificados com a Escola Livre de Teatro de Santo André, que, registre-se, perdeu força com a troca no governo municipal anos atrás, do PT para o PSDB. Espera-se agora que não aconteça o mesmo, na direção inversa, com a SP Escola de Teatro, de certa forma espelhada na de Santo André.
É significativo que a praça Roosevelt, reformada por José Serra, tenha sido palco de uma manifestação contrária a ele, também no último fim de semana.
O grande equívoco do ex-prefeito nesta campanha foi embarcar num discurso homofóbico, para agradar aos líderes católicos e evangélicos mais reacionários. Ex-ator amador do “Vento Forte” de Zé Celso, ele chega à eleição exaurido, inclusive na classe teatral, daí o ato Existe Amor em SP, com shows de Criolo e Karina Buhr, esta muito ligada ao Oficina.
Não vejo o menor problema no engajamento deste ou daquele artista nesta ou naquela linha política. Não vejo problema sequer no fato de atrair recursos deste ou daquele governante, desde que respeitada a lei. Vale para os Satyros como vale para o Oficina.
Muito do avanço recente nos orçamentos públicos diretos para teatro _como o Fomento, o ProAC, as estatais federais que sustentam companhias e abrem novos teatros na cidade_ saiu da afinidade inicial com este ou aquele grupo, ampliando-se depois.
Mas o importante é não retroceder, como aconteceu em Santo André. Novamente, espera-se que não haja descontinuidade por diferenças que são da política, não do teatro.
Fonte: Cacilda, 25 de outubro de 2012
Eu também fui à Praça pela Satyrianas, mas no fundo queria ver a nova Roosevelt que não projetou concretos, mas espaço para a circulação dos sujeitos de todas as tribos, de todas as cores, de todos os amores. Vi uma Praça como a Praça deve sere isso bastou aos meus olhos. A nossa Escola é só mais um equipamento que vai dar luz a esta Praça, porque a nossa Escola já deu certo, porque há vontade política e acadêmica pra ela dar certo. Discordo de uma unica informação do texto acima. José Serra não perdeu pelo discurso homofóbico, aliás, nåo pode ser considerado homofóbico quem mais fez por políticas públicas neste país, é só pegar o histórico dela na Prefeitura e depois no Estado. Os dois candidatos pecaram ao flertarem os conservadores, os fundamentalistas, o que não deve ser imputado apenas a Serra.Digo isso porque acompanho e acompanhei este discurso muito próximo, voce Ivam bem sabe disso. A propósito a conclusão de uma pesquisa pós eleições reflete o que o eleitor quis dizer nas urnas. De todo modo, eu espero que a nossa gestão municipal invista e insista em devolver equipamentos públicos como a nossa Roosevelt, tal como Serra decidiu e orquestrou lá atras, com a presença da arte ali, bem próxima do cidadão, porque a arte é a nossa ultima cartada para tentar mudar as coisas neste país. abraços.