Nos conhecemos há mais de 10 anos, mas nunca frequentamos a casa um do outro. Somos vizinhos e nossas conversas sempre acontecem nos encontros rápidos de entra e sai na portaria ou no elevador. Mas há mais de um ano sabia que sua filha chegaria da Austrália e que, enfim, ela conheceria seu neto de oito anos.
Na sexta-feira, quando cheguei em casa por volta das oito da noite, a campainha tocou e era ela. Meio afobada, pedia que eu ficasse com seu neto por um tempo curto, que ela precisaria acudir a filha que acabara de ser assaltada no metrô e estava em choque.
— Não acho que pode ser bom pra ele ir comigo porque acabaram de chegar da Austrália e lá não tem essas coisas de violência.
Nessa hora o garoto me olha e faz movimentos rápidos de olhos e cabeça, insinuando que a avó não sabia direito das coisas. Da mesma forma atabalhoada que a senhora chegou, saiu. Nem consegui dizer muitas coisas e o menino estava sob meus cuidados, exatamente no momento em que o telefone de casa começa a tocar.
Rapidamente me despacho, é uma chamada de telemarketing, embora eu tenha feito o pedido de bloqueio no Procon. O garoto australiano, que ficou parado perto da porta, me olha com estranheza.
— Você é muito antigo. Mais antigo que a minha avó.
Fiquei impávido. Nas últimas semanas tenho percebido que a vida insiste em me jogar na cara que o tempo está passando.
— Antigo, é? Por quê?
— Você tem um objeto estranho na sua casa. Só tinha visto esses telefones na televisão ou no cinema. É a primeira vez que vejo um telefone desses tocar.