O ritmo de trabalho aqui, no Reino Unido, tem sido frenético. Hoje à tarde, encerramos uma intensa maratona que teve início na segunda-feira, em Glasgow. Ao todo, conhecemos e visitamos dezenas de instituições.
A convite do People’s Palace Project e do British Council, uma comitiva, formada por representantes de projetos de vários Estados brasileiros, percorreu o trilho de programas inclusivos e de acessibilidade, na Inglaterra e Escócia.
Nosso desafio está sendo, o tempo todo, pensar em ações que possam diminuir o trânsito da exclusão. A segregação, seja ela de qualquer natureza, acaba com qualquer sonho de viver em uma sociedade justa e integrada.
Traçando uma ponte – e considerando que a responsabilidade dos acessos é coletiva e deve ser premissa para qualquer projeto –, talvez esse seja “o” momento para a SP Escola de Teatro. Afinal, nossa Instituição está apenas começando seu percurso, mas já traz em seu DNA um forte desejo de transformação, da construção do mundo como um espaço solidário. Sim, caros, há muito o que fazer.
É nosso papel refletir que o mais importante seja, de fato, a criação de oportunidades igualitárias – não me canso de repetir que, mais que “inclusão”, o que precisamos é de “acesso”; e que, talvez, os problemas do menino que mora do Jardim Pantanal, em São Paulo, e do cadeirante do bairro dos Jardins sejam muito parecidos. Acesso.
Não existe lugar melhor para se propor transformação do que o teatro. Devemos nos afirmar como agentes fundamentais dessa mudança. Ainda que não saibamos como – ou o que, ou para quem –, precisamos mudar e fazer mudar.
Aqui por estas bandas, estamos, também, fortemente em contato com a questão da diversidade na deficiência – e, é bom dizer, também não gosto nada desta palavra. A diversidade está na pauta das discussões e acredito que ela deva ser explorada. Não estamos em caixinhas, não somos todos iguais. Devemos nos orgulhar de nossas particularidades, e, mais que isso, respeitar e reconhecer a importância da singularidade do outro. Só assim estaremos efetivamente conectados com a contemporaneidade.
Então, a grande questão: como as organizações artísticas podem lidar com a questão da deficiência? Seria fabuloso ver patrimônio, esporte e artes trabalhando em conjunto, possibilitando o acesso ao treinamento e à educação. Me interessaria muito ver conhecimentos comuns, mas diferentes, sendo reunidos e difundidos em diferentes sentidos, propiciando acessibilidade comunicacional e atitudinal a todos que procuram por espaço na sociedade. Estou falando de equidade.
Poucos sabem, mas o vidro, por exemplo, é um pesadelo pra quem é cego. Tive esta certificação na alma. Quando, recentemente, perdi a visão do olho direito, por muito tempo, andei me confrontando com as portas de vidros dos shopping centers, como uma barata tonta. Um dos processos mais difíceis do meu aprendizado com uma visão parcial foi entender os reflexos e suas dimensões.
Mas, ao que parece, no futuro, os vidros estarão cada vez mais presentes em nossa paisagem urbana. E então, como será? Temos de pensar, e muito, em nossos espaços públicos acessíveis. Porque – importantíssimo dizer – os códigos de acesso têm validade. Como um acordo, precisam ser revisados sempre.
Não podemos ficar de fora desta discussão. Todos temos que ter a chance de estar em todos os lugares. É para misturar, mesmo. É isso o que procuro. E bem sei que a perseverança é capaz de fazer ruir todos os obstáculos.
Enfim, o que fazer para que todos tenham voz? A deficiência é um conceito socialmente construído. Acabemos com os preconceitos no mesmo âmbito, o social, o público. Não podemos esquecer que tem muita, mas muita gente que não quer pular, dançar, mas que quer se engajar na cultura.
Não existe apenas um jeito de lidar com acessibilidade, há muitas maneiras. Não queremos – e nem poderíamos – criar super-heróis. Afinal, não são super-heróis aqueles que se aventuram e esforçam para alcançar um objetivo, muito menos aqueles que, de certa forma, abrem caminho para tanto. Queremos seres humanos, como você e eu, vivendo juntos e culturalmente entrelaçados. Precisamos, sim, mudar os núcleos, atuar na raiz dos problemas.
Muito, muito importante pensar sobre o mundo, suas formas e suas coisas. Todavia, não fiquemos no plano da reflexão. Precisamos fazer. Urgentemente. Porque a mudança só se dá na ação.
Enfrentemos riscos!
Ivan, que visão consciente e humanitária você expõe!
Essa visão a cerca de inclusão e acessibilidade deveria pautar o pensamento de cada cidadão, de cada membro de nossa sociedade.
Acredito que o diálogo entre as várias classes, artística, empresária, profissionais liberais, principalmente política etc, seria um bom começo…
Cobrar que a legislação vigente seja aplicada, pois temos além dos Códigos, leis esparsas as quais permanecem letras frias no papel, sem serem sequer divulgadas, sequer aplicadas.
E que nós,enquanto, membros de uma sociedade que possui um Constituição Social, possamos fazer, cada qual nossa parte, saindo de nossa mesmice e colocando-nos no lugar do nosso semelhante.
Parabéns!