Vivemos tempos amorfos. Nossos corpos estão amortecidos, anestesiados pelo frenesi de uma sociedade que nos transforma a todos em engrenagens consumistas. Nossa sociedade cultua o devaneio narcísico da esculturação (body building), em que o corpo é simplesmente uma imagem do eu a ser exposta.
Num processo de trabalho, precisamos reenergizar nossos corpos, vozes e mentes. Exercícios de velocidade podem servir para a energização real do corpo, à revitalização dos músculos e da voz.
Artaud nos ensina que “no teatro as forças cósmicas, manifestadas por meios físicos, podem alcançar e tocar as energias físicas submersas não-verbais e subconscientes das massas, do que deriva seu conceito de um teatro da crueldade”.
Precisamos ativar nossa mente, a consciência absoluta de nossos sons e de nossos gestos. Ter consciência significa desalienar o corpo. A sociedade pós-moderna reduziu o corpo a uma ferramenta (un outil), alienando-nos dos nossos desejos “primitivos” ao torná-los matéria-prima para o mecanismo de consumo.
Nossos gestos não são por nós descobertos, são copiados e incorporados a partir dos gestos cotidianos sociais. Nossa voz é reduzida ao número de registros esperado, necessários ao nosso bom funcionamento.
Mas o teatro pode nos salvar. Um processo de trabalho deve ser tão desalienante quanto o resultado libertador. Mas como realizar um processo com autoridade no teatro buscando a Liberdade da Humanidade? Essa incoerência poderá ser revelada no resultado da obra e poderá estar implícita na sua (im) potência de transformação social.
Por ser uma arte coletiva, o teatro implica num acordo de todos os artistas envolvidos em seu processo, em que todos se sintam possuidores de uma alma artista que, de uma forma ou de outra, se manifesta claramente na obra final. Nenhum artista é livre no palco se não se sentir livre para fazer as opções estéticas em seu processo.
[1] Martin Esslin, Artaud, São Paulo, Editora Cultrix e Editora da Universidade de São Paulo, 1978, p. 77.LIBE