Então, estamos trabalhando em nosso novo projeto, “Satyros’ Satyricon”, que tem estreia na mostra contemporânea do Festival de Curitiba, no final de março.
Idealizado e dirigido por Rodolfo García Vázquez, escrito por Evaldo Mocarzel, a partir da novela romana de Petrônio (60 d.C.), três eventos compõem esta nova empreitada: uma instalação cênica (“Trincha”), uma peça (“Satyricon”) e uma festa-performance (“Suburra”), que serão apresentados em dias e horários alternados.
Cada um dos eventos pode ser assistido independentemente do outro, sendo ações artísticas singulares. 21 atores compõem o elenco do programa que tem, ainda, como alicerce de pesquisa, as obras “Multidão” e “Império”, de Michael Hardt e Antonio Negri.
Petrônio, em sua criação, faz uma crônica da vida na Roma antiga. Dois amigos disputam o amor de um jovem e, quando um deles é preterido, envolve-se em uma peregrinação onde encontrará tipos e acontecimentos surpreendentes. O projeto pretende traçar um paralelo aos acontecimentos atuais.
Na Roma Antiga, havia o bairro de Suburra, o lugar da devassidão, da prostituição, das putas, dos michês. Pessoas de todas as regiões do Império – Europa, Ásia e África – vinham para a cidade que tinha uma população de mais de um milhão de habitantes – um fato surpreendente para a época. Começou, ali, a primeira ideia do que chamamos de globalização.
Em nosso projeto, o mote central é um traçado desta Roma Antiga com o mundo globalizado atual. Assim, pensamos que Suburra pode ser a Praça Roosevelt, onde arte, devassidão e humanidade caminham de braços dados.
Mas é Carnaval e, porque Deus ajuda quem cedo madruga e o trabalho não espera o sol voltar, nossos atores-devassos-satyricos mergulharam em dias incansáveis de treinamento aqui no meu paraíso, em Parelheiros. O lugar, sempre muito tranquilo, calmo e acolhedor, viu seus dias tremerem. Eu disse lá em cima – lembram-se? –, que o elenco é composto por 21 integrantes!
O mais engraçado, no entanto, foram as ligações e chamadas de amigos que não participariam dos ensaios – sequer integram o elenco da peça – mas que queriam vir pra cá. Resultado: na noite de sábado, meu jardim virou um acampamento – haviam duas barracas montadas. E, dentro de casa, colchões e colchonetes foram espalhados por todos os cômodos para mais de 30 pessoas dormirem aqui.
Eu, que não faço parte do elenco do espetáculo, passei dias incríveis ao lado da Cacilda, a mascote da SP Escola de Teatro. Sim, nossa amada vira-latas também está aqui conosco. E numa alegria contagiante.
Não apareceu samba por aqui. Em alguma situação, tentaram emplacar um CD da Clara Nunes, mas o povo desanimou. Em outro momento, veio a Elza Soares mas em sua fase mais samba rock. Muito indie rock, trip hop, o novo álbum da Céu, Lana Del Rey e até o “21” da Adele que não saiu dos nossos ouvidos.
Só fiquei preocupado com a pintassilgo que resolveu fazer seu ninho bem na soleira da porta de entrada da casa. E, com tanta agitação, acho que se deprimiu. Tem passado os dias vigiando seu ninho à distância. E ainda não a vi – nem uma única vez sequer –,chocando seus três ovinhos, lindos, lindos.
Mas daqui a pouco vamos embora e a paz e o silêncio voltarão ao mundo dos meus pintassilgos, esquilos, quatis e saguis. É que eles não estão nada acostumados com esse mundo de devassidão, muito menos conhecem Petrônio, Mocarzel e nada sabem da Praça Roosevelt.