Ivam Cabral – Durante a temporada de “Sades ou Noites com os Professores Imorais”, mais de uma vez ameaçou pegar fogo no teatro. No meio da peça estourava tudo e saía todo o mundo pra a rua, público, atores. E como o elenco estava pelado era engraçadíssimo. Saía todo o mundo como estava, pelado mesmo, cobrindo o corpo com tecidos que achava por ali, no cenário. Um dia explodiu tudo. “Fogo, fogo.” Saiu o público, saiu todo mundo para a rua. Me cobri com um pano, ali e fui também. Quando chego lá fora encontro a Silvanah Santos, só com um saiote que ela usava na peça, nua da cintura pra cima, cobrindo os seios com as mãos. E ela me pergunta, singelamente: “Ai, meu Deus, o que aconteceu?” Olhei pra ela, seminua em plena Major Diogo, misturada com o público, com as pessoas que passavam pela rua, moradores dos prédios vizinhos. Eu disse: “Sil, o teatro ameaçou pegar fogo”. E ela: “Meu Deus, e agora?” Silvanah tem belos seios, é alta, bonita, e era muito engraçado ver aquela figura esguia ali, em plena Major Diogo. Adoro essa história. Só não lembro direito como terminou. Tem uma outra história que adoro, maravilhosa, sobre nossa precariedade. Foi quando o Nelson de Sá, que já era crítico da “Ilustrada”, foi ao teatro pra ver uma peça dirigida pelo Robert McCrea, que estava estreando lá. Era uma noite em que chovia muito na cidade.
Rodolfo García Vázquez – McCrea e o grupo dele estrearam uma peça nos Satyros, e Nelson de Sá foi ver. Só que chovia muito, tinha muitas goteiras na platéia, acho que eram uns dez pontos de goteira, e aí estava cheio o teatro e nós desesperados. Meu Deus do céu, imagina se o crítico da “Folha de São Paulo” sentasse embaixo de uma goteira. Seria uma catástrofe, porque daí não poderia mudar de lugar, e ele teria de ir embora. Não assistiria à peça porque tinha uma goteira no nosso teatro. Então organizamos os atores de “Salomé”, que estavam lá porque íamos ensaiar. Colocamos nosso elenco nos primeiros lugares da fila de entrada pra sala de espetáculos, para que se sentassem embaixo das goteiras. Então, quando abriu a porta, os atores entraram antes do restante do público, e sentaram debaixo das goteiras, para que o Nelson de Sá não se molhasse. Vários atores ficaram ensopados.
Fonte: “Cia. de Teatro Os Satyros: um Palco Visceral”, de Alberto Guzik, Coleção Aplauso, Imprensa Oficial de S. Paulo, 2006