Hoje, rolando o Instagram, apareceu um vídeo do Ney Matogrosso — com seus olhos de abismo e voz de lâmina. Ele dizia ter vencido a maior batalha da vida ao beijar o próprio pai. E completava, sem vergonha da ternura: “Fui o filho que mais beijou o meu pai.” Fiquei ali, suspenso, como quem escuta […]
CRÔNICA | O ofício e o abismo
É raro, mas eu conheço atores que nascem com a cena no sangue. Não é apenas talento, é algo mais fundo, como uma ferida de origem ou uma vocação antiga, daquelas que atravessam gerações sem pedir licença. Tenho pensado muito em um deles, talvez porque, algum tempinho atrás, ele fez um post em uma de […]
REFLEXÃO | O peso leve do trabalho
Esta semana, numa dessas conversas de corredor que, por vezes, são mais densas que um seminário inteiro, eu e Danilo Stavale – companheiro de jornada na SP Escola de Teatro – tropeçamos, como quem não quer nada, no assunto do nosso ofício. Falávamos sobre o teatro, esse lugar onde a realidade se desdobra em ficção […]
ADEUS | O Cuoco que Acompanhou a Minha Infância
Morreu Francisco Cuoco. E o que sinto é uma tristeza íntima, como se tivesse partido alguém muito próximo, desses que a gente sabe onde mora, que cumprimenta na rua, que frequenta nossas casas aos domingos. Mas nunca nos conhecemos. Nunca o vi de perto. Nunca trocamos uma palavra. E, mesmo assim, ele estava lá, atravessando […]
CRÔNICA | O Bilhete e as Músicas do Ricardo
Já que falamos de cartas, me lembrei hoje que eu também amo escrever bilhetes. Pra tudo. Qualquer coisa já estou escrevendo um bilhete. Mas escrevo também para deixar um aviso, para fazer graça, para me declarar. Minhas primeiras investidas amorosas, ainda na adolescência, foram através deles. Pedaços de papel dobrados com cuidado, letras tortas, promessas […]
CRÔNICA | Escrevendo para ninguém
Escrevo para ninguém. E não há aqui qualquer tom de lamento. Antes, escrevo com uma obstinação quase biológica, como quem registra os próprios batimentos cardíacos só pra provar que ainda há pulso. Mas sigo escrevendo. Não por vaidade, mas por necessidade. Cada linha é meu jeito de gritar baixinho: estou vivo, estou disposto a encarar […]
TERRAS DE CABRAL | Blog é coisa de velho
Houve um tempo – e não faz tanto assim, apesar do calendário insistir em me contrariar – em que ter um blog era mais do que um hábito, era quase uma declaração de smor e de princípios. Inaugurar um blog no início dos anos 2000 significava dizer ao mundo: “Ei, eu existo, tenho opiniões e, […]
MEIO AMBIENTE | Reflorestando o Impossível
Quando inauguramos a SP Escola de Teatro, em 2009, no coração do Brás, eu não sabia que o bairro se tornaria uma espécie de espelho invertido da minha própria concepção de mundo. Vindo de uma vida pautada por reflexões sobre o meio ambiente, eu ainda pensava esse conceito como uma paisagem de árvores, rios, pássaros, […]
CRÔNICA | No frio que nos atravessa, a ternura que resta
A manhã chega embaciada de cinza. A TV anuncia: madrugada mais fria do ano. Lá fora, a cidade estremece. Cá dentro, algo também se encolhe. O frio não é só temperatura, é convocação de memória, de vínculo, de angústia. A psicanálise nos ensinou que o trauma, às vezes, se anuncia como uma brisa gelada que […]
PSICANÁLISE | A Radiografia Invertida
Na clínica psicanalítica, o espelho não está na parede — está entre as palavras. Não é de vidro, é feito de silêncio, de lapsos, de retornos insistentes. Costumo dizer que eu sou a minha clínica. Parece afirmação solene, quase litúrgica, mas é só um reconhecimento simples. Se colocássemos todos os meus pacientes lado a lado, […]