A história começa triste. Um labrador caramelo é abandonado doente, aqui, perto de casa. Vizinhos presenciaram a cena. Um Palio preto se aproxima do nosso condomínio, um homem e uma mulher descem do carro e enxotam o pobre animal. Em seguida, partem em disparada.
O cão, cerca de um ano e meio, começa a perambular pela vizinhança e, no dia seguinte, no último dia do ano, pela manhã, o Rodolfo acorda e vai dar um passeio até a represa Guarapiranga, cerca de 200 metros de casa, e começa a ser seguido pelo labrador caramelo todo doente que, a partir daquele momento, não o deixa sozinho nem por um segundo.
Rodolfo ainda tenta despistá-lo, dando umas voltas por ali, mas não adianta. No retorno pra casa, vem seguido pelo labrador e está sensibilizado.
Não sabemos muito bem o que fazer. Entretanto, percebemos que o cão está faminto. Há ração para cães em casa (da Cacilda, nossa vira-latas da SP Escola de Teatro que muitas vezes vem passar uns tempos comigo aqui, em Parelheiros).
Colocamos água e comida e o pobre animal, faminto e cheio de sede, devora tudo com avidez.
Percebemos que há muitas feridas em seu corpo. Mas é um dia complicado. 31 de dezembro, hora do almoço, o mundo todo se preparando para as festas de réveillon.
Vou pra Internet e começo a pesquisar algum veterinário por aqui. Por fim, localizo um hospital em Interlagos e é pra lá que levamos o pobre cãozinho.
Depois de horas intermináveis de espera (o pronto-socorro naquela tarde estava muito agitado), somos atendidos. Curioso, no entanto, é que, na chegada ao hospital, precisamos preencher uma ficha com nossos dados. A atendente colhe meus dados pessoais e quando pergunta o nome do animal eu respondo, meio no susto mesmo:
– Chico.
A médica veterinária, ao examiná-lo, descobre que Chico tem miíase – uma infestação na pele produzida por larvas de moscas. Está febril e desidratado.
Depois de algumas horas ali no pronto-socorro, voltamos pra casa. Chico vem de banho tomado, medicado e está mais animado.
Mas Chico é um legítimo labrador, jovenzinho ainda, e eu não me iludo. Já convivi com labradores e conheço bem suas vivacidades. Mas não tenho coragem de deixá-lo na garagem. Afinal, ele está adoentado, é a última noite de dezembro e estamos nos preparando para os festejos da passagem do ano. Chico, então, é convidado para ficar conosco na sala de casa.
Tudo corre lindamente, Chico participa de nossa festa, interage com as pessoas, está animadíssimo. A esta altura, já não tem mais febre e está feliz.
Horas depois, quando vamos dormir, o impasse: onde? Resolvo arriscar e arrumo um canto para ele na sala. Coloco ali umas almofadas, um cobertor e peço a Deus que ele se comporte.
O que acontece nos dias seguintes é surpreendente.
Chico é amável e extraordinariamente educado. Dorme na sala com livros, CDs, e chinelos e, pasmem, não faz nenhum estrago.
Ainda não sei direito como esta história vai acabar. Em casa, tenho três gatos; e na SP Escola de Teatro, temos a Cacilda. Neste momento, Chico não teria espaço em minha vida. Mas, pelo andar da carruagem, também não consigo imaginar o meu mundo sem ele. O que sei, seguramente, é que o destino quis me mostrar alguma coisa. E, conheço a lei, com destinos não se brinca.
tomara q vc consiga ficar com ele! e que o palio fure os 4 pneus numa chuva forte heheheh
Ivam, querido,
você está me dando uma lição de vida…
Nosso Toby morreu em meus braços há 4 anos… tive que sacrificá-lo porque não tinha mais como sobreviver, já estava com uns treze anos e terminal…
E então minha mãe eu juramos que nunca mais teríamos um cão para chorar sua partida.
Confesso que não sei como agiria se Chico aparecesse em minha porta…
Admiro demais você e Rodolfo pela generosidade.
Deus haverá de abençoá-los, e a Chico também!
Ivam, nas vésperas do Natal, em Piracicaba, meus três filhos e sua mãe acompanharam todo o sofrimento do labrador Otto que durante 10 anos alegrou a vida deles. Otto havia sido contaminado – há uns três anos – por uma terrível doença transmitida por carrapatos e mesmo com todo o cuidado de dedicados veterinários, com os medicamentos que teve que tomar, com as internações, soros etc, não resistiu. Deixou de viver, numa longa madrugada. Não abandone o Chico, por favor. Ele, com certeza, vai lhe dar tantas alegrias, mas tantas alegrias, que você vai saber arrumar um lugar para ele em sua vida. Vida longa e muita alegria para todos.