Hoje, 20 anos da morte de Piazolla. E eu me lembro de tantas, tantas coisas.
Em 1985, eu estava no primeiro ano do curso de Artes Cênicas da Fundação Teatro Guaíra e PUC/PR, em Curitiba. Naquele período, estava aprendendo muito. Havia interrompido um curso de Admistração de Empresas no quarto ano, tinha 21 anos e o mundo pela frente. Escrevi, naquele momento, meu primeiro texto teatral, “Qualquer Semelhança É Mera Coincidência”, sobre uma mãe que perde um de seus filhos de maneira trágica e vai viver seus dias com os fantasmas da culpa.
No ano seguinte, em 1986, precisamente numa quarta-feira de cinzas, este meu texto teve sua estreia no mini-auditório do Teatro Guaíra. A peça, dirigida por Isabella Zanchi, foi encenada por um elenco numeroso, encabeçado por Darson Ribeiro. Na trilha, a música de Astor Piazolla.
Piazolla iria, a partir deste momento, marcar profundamente a minha vida. Até hoje, quando o escuto, um cheiro e gosto de novidade – e agora de melancolia também – me invade. Como disse, aquele momento foi de descobertas. Especialíssimo, portanto.
Eu tinha aulas no Teatro Guaíra que era dirigido pela Lúcia Camargo, minha companheira de SP Escola de Teatro hoje. E Lúcia, sempre inquieta, fazia lá uns malabarismos doidos para integrar seus alunos aos artistas que vinham trabalhar em seu teatro. Foi assim que conheci – e trabalhei – com Paulo Autran, Celso Nunes, Antonio Abujamra, Dina Sfat e tantos outros.
Mas, então, um dia, aparece pelo Teatro Guaíra o Astor Piazolla. Está em turnê pelo Brasil e aporta em Curitiba. Como Lúcia tinha nos acostumado mal, lá vamos nós, seus pupilos, pedir para que liberasse nossos convites. Me lembro da Lúcia nos perguntando o que a música de Piazolla tinha a ver com a nossa formação teatral. E, claro, respondemos de pronto: Piazolla, naquele momento – e pelo menos ao nosso alcance – era o mais teatral de todos os compositores.
Conseguimos nossos convites e, pontualmente, às 21h. estávamos na plateia do Guairão para assistir ao nosso ídolo. Encantamento puro. Piazolla nos conduzia para um mundo excepcionalmente mágico.
Ao final do espetáculo, fomos ao camarim de Piazolla que nos recebeu com o maior carinho do mundo. Estavam por ali, ainda, dois monstros da música: Flora Purim e Airto Moreira, que também haviam assistido ao espetáculo.
Terminamos a noite num restaurante da Rua Augusto Stellfeld, bêbados e alegres. Eu só tinha vinte e pouquinhos anos e o futuro inteiro pela frente. Era feliz e sabia disso.