Em abril de 2015, o tempo era outro, e o Twitter ainda guardava algo de bilhete lançado ao vento. Foi por ali que recebi uma mensagem singela: “Oi Ivam! Então, semana que vem estarei em SP para passar uns dias. Queria muito conhecer o Espaço dos Satyros e tal… É possível? Beijo!!”
Era Thiago, um jovem baiano de Salvador. Convidei-o para ver nossas peças — Pessoas Perfeitas e, no Satyros Dois, Juliette — e combinamos um café no dia 27 de abril, um domingo, às 18h. Mas ele não apareceu. Escrevi: “Ah, fiquei te esperando, não rolou?”. E ele, febril, respondeu com delicadeza: “vou ter que deixar para conhecê-los da próxima vez…”.
E assim começou nossa correspondência intermitente, dessas que atravessam o tempo sem pressa.
Em novembro de 2021, já com a pandemia se despedindo, ele apareceu perguntando se os cursos da SP Escola de Teatro seriam presenciais ou online. “Queremos muito que sejam presenciais, se a pandemia nos deixar…”, respondi. E o tempo, que parece ir, mas apenas se transforma, fez seu trabalho.
Em 2023, Thiago passou no nosso processo seletivo e começou o curso de atuação. A cidade o recebeu, e o teatro o escolheu de volta.
Curiosamente, nunca ficamos muito próximos. No início, imagino, ele se sentia tímido com minha presença. Ainda hoje percebo certo recuo, uma distância de reverência. O que ele talvez não saiba é o quanto o admiro. Thiago é desses garotos raros: tem talento, sensibilidade e uma escuta bonita do mundo. Se persistir, será reconhecido nacionalmente. Disso eu não tenho dúvidas. O teatro, a TV, o cinema, todos haverão de se abrir para ele.
Recentemente, em um de seus experimentos, seu núcleo cantou Eu, Você e a Praça, de Odair José. Sorri ao ouvir. Porque ali, naquele gesto, havia um elo secreto entre nós dois. Uma ponte invisível feita de memória e afeto.
Odair José é música da minha infância. E, pelas redes de Thiago, percebo que ele carrega, com devoção, os ídolos de sua mãe. Talvez ela tenha lhe passado, sem perceber, essa herança de canções, como quem oferece o colo de um tempo.
E, embora eu saiba que a escolha da canção tenha partido da direção do experimento, acredito em energias, em sincronicidades. É claro, pode ser apenas uma piração minha – e nunca falei disso com ele –, mas achei bonito trazer essas associações agora. Afinal, hoje é aniversário de Thiago.
E sei que ele anda tristinho. São Paulo, às vezes, é dura com quem chega cheio de sonho. Falamos sobre isso. Disse-lhe que ter vinte e poucos anos neste tempo que se vai não é tarefa fácil. Mas garanti – porque sei, porque vivi – que as feridas da juventude um dia se transformam em asas.
Vai ficar tudo bem, Thiago. Você será uma pessoa feliz. Acredite. E voe.
Ah, e por falar em Odair José, ele estará no Cine Bijou no mês que vem. Quem sabe a gente não pede para ele cantar Eu, Você e a Praça?
Feliz aniversário, querido.
