“A Primeira Pessoa”, uma coleção de doze contos – a maioria escritos em primeira pessoa –, da escocesa Ali Smith, é uma obra sofisticada.
Identidade, medo, música e amor são temas recorrentes que, com naturalidade e fluidez indiscutíveis, traz personagens familiares, profundamente humanos e, na maioria das vezes, comuns; quase sempre em crise.
Delicado, o livro retrata o cotidiano em histórias muitas vezes surpreendentes.
Num dos melhores momentos da obra, no conto “A Criança”, a narradora vai ao supermercado na folga do almoço para fazer a feira da semana quando se depara com um bebê que surge, misteriosamente, em seu carrinho de compras. Embora insista em dizer que a criança não tem parentesco com ela, tudo ali parece indicar o contrário.
Em outro momento do livro, “N’água”, a narradora de 40 e tais anos se encontra com o seu eu de 14 anos. O encontro das duas é de uma genialidade que primeiro enternece, depois faz pensar.
Também dramaturga, Ali Smith é hoje um dos grandes nomes da literatura mundial. O jornal The Guardian afirmou que a autora está entre os escritores ingleses mais originais dos últimos quinze anos.
Mas é o jornal The Independent quem melhor define o livro: “É difícil explicar o que faz destes contos tão maravilhosos. Talvez seja mais útil simplesmente dizer: leia-os.”
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TRECHO:
Se chover hoje à noite a madeira não vai empenar imediatamente. Mas se a gente deixar a mesa ali fora a céu aberto muito tempo, vai rachar. Vai rasgar. Vai manchar. Vai ficar cheia de pequenos rastos nos pontos onde as vespas e outros bichos roeram para pegar material para os ninhos. As pernas da mesa vão afundar na grama, a grama vai subir e se enroscar nas pernas. As trepadeiras vão encontrar a mesa. O calor e o frio vão acabar com ela. O verde vai engoli-la, vai morrer e brotar de novo em volta dela, deixá-la velha, estragada, ressequida.
Clique aqui e leia “Um Conto Real”, trecho do livro “A Primeira Pessoa”.
“A PRIMEIRA PESSOA”, ALI SMITH
Companhia das Letras