Da mesma matéria que nossos sonhos

Da esq. p/ a dir.: Valmir Santos, Ivam Cabral, Eugenio Barba e Carlos Simioni (foto: SP Escola de Teatro)

A cada dia que passa, a SP Escola de Teatro me faz sonhar mais e, neste movimento, concretizar um tanto de coisas em um projeto inspirador para qualquer artista. Para minha felicidade, não estou sozinho nesta empreitada.

Diria que somos, aliás, bastante pretensiosos. Costumo dizer que se trabalhássemos na área médica, estaríamos pesquisando as células-tronco. Se fosse uma empresa de engenharia, seria de pesquisa genética. Mas estamos no teatro, conectados com o que há de mais potente e moderno no mundo. Nossa pedagogia tem se debruçado o tempo todo em não pensar o mais fácil. Por isso, temos um sistema pedagógico tão singular quanto complexo.

Nosso time é composto por alguns dos maiores artistas e pensadores de teatro do Brasil e, mesmo assim, nunca nos acomodamos. Basicamente, porque este projeto surgiu da troca de ideias e de experiências de artistas que se uniram em torno de um sonho em comum. E, hoje, quatro anos depois, não por acaso e não sem muito suor, somos a maior escola de teatro da América Latina.

É por isso que nos colocamos cada vez mais em contato com o outro, na busca da compreensão global do artista e do ser humano, priorizando a horizontalidade e a emancipação criadora, o pensamento crítico e a confluência absoluta de talentos e poéticas em detrimento da ênfase na relação hierárquica e do pendor acumulativo temporal que costumam minar as bases educacionais.

Ao adotar um ensino modular, não acumulativo e não hierárquico, nossa principal intenção é formar artistas críticos e solidários. Artistas que tenham autonomia e liberdade para criar, mas sem deixar de lado o rigor e a responsabilidade.

Como trabalhamos com a excelência, decidimos, no início deste ano, realizar um grande colóquio. Ele recebeu o nome “O que é a pedagogia do teatro?”, e surgiu com a ideia de elucidar e organizar temas e criar um instrumento de trabalho da pedagogia do teatro. Dividimos em 13 mesas, com curadoria e mediação da Prof.ª Dr.ª Ingrid Dormien Koudela. Essas discussões permearam o ano e se encerrarão amanhã.

De abril para cá, tivemos provocações ricas e debates férteis, protagonizados por mais de 30 nomes de enorme relevância para o teatro, sendo um deles internacional, o alemão Florian Vassen. Passaram pela SP, neste período, os grandes nomes da pedagogia. Vimos discussões altamente qualificadas, abrangendo um extenso campo intelectual da arte teatral.

Para montar, manter e aprimorar cada vez mais nosso sistema, procuramos, ainda, o diálogo com artistas e pensadores de fora do Brasil. Como não poderia deixar de ser, o contato com cada um deles nos fortalece e faz com que avancemos em direção a uma formação mais globalizada.

Neste momento, por exemplo, Suzanne Osten, diretora, dramaturga e professora sueca, diretora artística do Teatro Unga Klara desde 1975, está conosco na Escola. Na segunda-feira, ela ministrou uma palestra incrível, levantando questões importantes sobre o teatro para a juventude. Também temos encontros diários com Suzanne, em workshops que ela ministra aqui.

Essa relação começou ainda em março deste ano, quando viajamos à Suécia. Ali, nos reunimos com as coordenações da SADA (sigla que designa a Universidade de Teatro e Cinema de Estocolmo). Ficou acordado que, a partir do ano que vem, a Real Academia de Estocolmo, responsável pelo curso de Atuação da SADA e a SP Escola de Teatro utilizarão o mesmo Eixo Temático, Operador e Material de Trabalho para o desenvolvimento de seus projetos pedagógicos. Suzanne é quem ajudará nessa missão, atuando como supervisora pedagógica de ambas as escolas por um semestre.

E nossos laços se estendem por vários outros países. Só neste ano, recebemos gente de Cuba, México, Portugal, Inglaterra, Alemanha, Japão, Canadá, Estados Unidos, Nova Zelândia, Finlândia, Escócia, Nigéria, Cabo Verde. Todos esses artistas, sem exceções, têm trabalhos respeitadíssimos em seus respectivos países, e muitos são reconhecidos mundialmente.

Quanto mais me ligo a essas pessoas, mais me sinto fazendo parte de uma rede universal, que interliga todos os amantes de teatro, de arte, de cultura. E maiores tornam-se os meus sonhos. Resta-me uma certeza: não vou parar de tentar mudar o mundo. Não vou. Me recuso! E o sonho, assim, continua…

Ator, roteirista e cineasta. Co-fundador da Cia. Os Satyros e diretor executivo da SP Escola de Teatro.
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